É claro que já ouviste falar nas Caldas da Rainha. Mas se nunca lá estiveste, nem sabes o que perdes. Seja pelos tão afamados falos que adornam tascas por esse país fora ou mesmo pelos Zé Povinho que retratam bem a atitude de qualquer estabelecimento, perante o clássico pedido de fiado: “queres fiado? TOMA!“.
Essas figuras ex-líbris da exportação cultural das caldas da rainha são as mais conhecidas mas, nos últimos 30 anos, nem só de faianças vive a cidade. Impulsionada pela sua Escola Superior de Artes e Design (ESAD), a urbe das Caldas da Rainha goza de um estatuto de Cidade Artística na qual diversos artistas de variadas disciplinas adornam a metrópole com os seus trabalhos.
Marta (Felícia Pimenta) Costa é natural de Vila Nova de Famalicão e é estudante de Programação e Produção Cultural na ESAD. De sua própria volição decidiu, enamorada pela vivacidade artística da cidade, fazer ela mesma um documentário de 80 minutos sobre a mesma, expondo assim tudo o que a autor viu nas Caldas da Rainha: Ateliês, Museus, Centro de Artes, Silos Contentor Artístico, Grêmio Caldense, Centro Cultural e de Congressos, Teatro da Rainha, Coletivos, Caldas Late Night, ESAD e Comunidade, Vida Noturna, Música nas Caldas.

Olá Marta como estás?
Como sempre digo, estou ótima, sempre ótima.
Isto é o teu primeiro ano nas Caldas da Rainha, certo? Como surgiu esta ideia de fazer este documentário, tendo em conta que és uma primeira anista?
Sim, é o meu primeiro ano nas Caldas. Bim estudar para a ESAD em outubro de 2021 e, para ser sincera, com poucas expectativas acerca da cidade. Tinha ouvido uns burburinhos que nada se passava por cá. Como venho de uma cidade onde também não acontece nada, e sou uma pessoa que gosta da solidão, não me importei. Para espanto meu, apaixonei-me pela dinâmica desta cidade. Desde os “malucos” da ESAD, passando pelo vasto centro territorial histórico até às grandes oportunidades de contacto que consigo criar. É uma cidade de artistas e para artistas. Eu não sou artista, ou não me considero artista, mas sinto-me inspirada ao viver cá, pinto e escrevo mais do que nunca.
A ideia deste documentário surgiu durante uma aula de Sociologia das Artes, lecionada pelo Alix Didier Sarravy, que tem uma abordagem de ensino onde deixa a individualidade de cada aluno sobressair. Portanto, o professor deu-me a oportunidade de escolher uma temática; daí fazer a minha pesquisa e uma visão sociológica. No processo de criação desse meu relatório fui entrevistando várias pessoas e notei que o que estava a fazer era mais do que um trabalho académico e que merecia ser partilhado.
Como te organizaste para o executar?
Eu por acaso organizei-me bastante para este desafio, o que me choca pois não sou a pessoa mais organizada. Normalmente sou impulsiva e movida apenas pela intuição.
O tempo era curto, claro. Na última metade do mês de abril dediquei-me a organizar os prazos de cada etapa, desde a escolha de entrevistados até ao design gráfico dos cartazes que espalhei pela cidade.
Comecei as filmagens a 13 de maio e acabei a 2 de junho. Tudo estava muito bem definido, mas já se sabe que nunca corre exatamente como queremos. Quatro pessoas que gostaria que tivessem participado tiveram incompatibilidades de horários, por exemplo.
Já tinhas alguma experiência prévia?
Sim, já tinha alguma experiência prévia e sempre me senti confortável atrás de uma câmara. A minha ideia no secundário era seguir Ciências da Comunicação até quando cheguei às Caldas. Logo, no primeiro mês juntamente com o meu amigo André, criei o “Conversas à Vontade”: um programa de entrevistas.
Explica um pouco, o que são as “Conversas à Vontade”?
“Conversas à Vontade” é um programa de entrevistas que publico no meu canal de Youtube “Felicia Pimenta” e que consiste em ter uma conversa informal, “à vontadinha” com os meus ídolos. Penso que esteja a dar bom resultado.
Em alguns episódios sou eu a única entrevistadora, noutros fiz parceria com o meu colega de turma Pedro Machado e estou sempre aberta a novas parcerias.
O que pensas que este documentário traga ao discurso artístico caldense?
Muito pouco, sinceramente acho que este documentário é um circo de bajulação à cidade. É mau? Até pode não ser, mas acho que devia ter realmente colocado a minha opinião e a minha visão sobre os problemas da cidade. E irei fazê-lo no meu próximo projeto. Este “erro” foi um belo aprendizado. Quero ter critica nos meus projetos.
Quem pensas atingir?
Quando eu vim para as Caldas, gostava que algo do género deste documentário existisse. Então, pretendo atingir os recém-chegados à cidade. E também, claro, os artistas que podem não conhecer certos coletivos e colegas artistas que estão dispostos a receber e a ajudar quem precisa.
Que reações esperas retirar?
O meu documentário foi exibido no Caldas Late Night, numa sessão do Cinema ao Ar Livre. No final disseram-me que é um documentário bastante educativo.
No começo gostaria que fosse entretenimento, algo fácil de se perceber. Mas como disse na resposta anterior, o que eu queria mesmo é fazer com que as pessoas, mesmo quem nasceu, cresceu e vive nas Caldas, aprendam algo. Imensa gente me disse que isso aconteceu.
Quais foram as maiores dificuldades de fazer este projeto?
A maior dificuldade foi a ansiedade que se gerou dentro de mim. Fiquei apaixonada, obsessiva pela idealização deste documentário. Nunca quis fazer um trabalho documental, nunca tinha editado nada, nada mesmo, nem sequer alguma vez tinha juntado o áudio a um vídeo.
Portanto, durante o tempo da criação deste projeto, decidi não ter vida social. Ia para as aulas e no final tinha sempre umas quantas reuniões de café, para receber informação acerca da vida artística na cidade ou tinha as entrevistas. Aos fins de semana observava e gravava a vida na cidade.
Ficava com insónias, só queria editar, melhorar, regravar. Quando conseguia dormir sonhava com o documentário. Mas estava feliz e sentia-me realizada.
Só pensei em desistir no início pois não tinha ajuda de nenhum colega que tivesse conhecimentos acerca de edição de vídeo. Mas a persistência lá venceu a sua e sinto-me bem ao dizer que fiz este vídeo documental de 80 minutos sozinha.
Agora encaro outra dificuldade, não me sinto satisfeita com o resultado. Talvez por o ter visto vezes sem conta. Eventualmente o reedite, quem sabe.
Agora estou na minha busca por mais projetos que me desafiem tanto.