Samuel Úria tinha previsto lançar o novo álbum, Canções do Pós-Guerra na Primavera deste ano. Adiou para Setembro, devido a uma pandemia que ainda não teve “pós”, mas que já conta com inúmeras guerras transeuntes. De propósito ou não, o artista natural de Tondela, acertou com o título na mouche dos tempos actuais.
Samuel Úria tinha apresentado o EP Marcha Atroz em 2018, que veio calcar terreno para o novo longa duração. Aliás, a discografia de Samuel Úria tem andado em linhas crescentes, mas rectas, sem grandes oscilações. Filho do Rock and Roll e de uma Flor Caveira independente e irreverente, o compositor português andou sempre de mãos dadas com a música íntima, com a poesia cantada e com as canções ternurentas.
Canções do Pós-Guerra é mais um trabalho extremamente poético em todas as anotações artísticas. As letras, os arranjos, a produção fantástica de Miguel Ferreira e o arrojo videográfico que acompanha todas as faixas do albúm.
Este “quase-se filme” que está disponível no Youtube, conta com realização de Joana Linda, que segue um Samuel Úria deambulante pelas ruas de Lisboa. O cantautor, em declarações à Lusa, afirma que “no final, tudo se resume a uma homenagem ao meu processo criativo (tantas vezes desembargado em passeios a pé por Lisboa).”
“Para que a história não se repita, é preciso saber contar”
Samuel Úria sempre foi exímio em tratar a música com carinho, mas não deixa de apontar o dedo. Em Canções do Pós-Guerra, o cantautor dispara poesia e metáforas contra alguns valores sociais infiltrados no nosso caminho. O single Fica Aquém, ainda lançado em 2019 e que agora integra o novo álbum, é sinónimo de abanão e é um retrato duro a uma realidade.
Na verdade, logo na primeira faixa do álbum, Ao Pós, não existe assim tantas metáforas, surgindo um confronto directo com a própria história, que, “para que não se repita, é preciso saber contar”.
Como já aqui foi dito, esta é uma produção de Miguel Ferreira e é um dos maiores trunfos do novo disco. Há muitos coros introduzidos nas canções que enchem e fazem crescer a musicalidade de Samuel Úria.
É o caso da faixa Tempo Aprazado. Ainda tenho de perguntar ao autor se há alguma inspiração no poema com o mesmo nome da austríaca Ingeborg Bachmann (Samuel, estás aí para me reponder?). A verdade é que se conseguem tirar emoções bastante semelhantes, principalmente com os referido coros que elevam a canção, numa ascensão progressiva e bastante sentimentalista.
Como se pode ver, o disco é devoto à música meiga e lenta, identitária de Samuel Úria. Em Cedo, com a participação de Monday aka Catarina Falcão, há uma faixa a duas vozes, num stereo entre o feminino e o masculino. No vídeo desta música, a Pop Folk que caracteriza a guitarra do autor, acompanha os dois músicos numa viagem de Tuk-Tuk pelo centro de Lisboa.
É verdade que o compositor se caracteriza muito pelo registo intimista. Contudo, quem já viu Samuel Úria ao vivo, com certeza já notou aquelas ancas a brilhar. Mexe-se bem, o rapaz, e para isso precisa da ajuda de músicas como Contenção, que apalpa um estilo mais dançável. Aliás, o vídeo de Joana Linda que acompanha este tema, mostra a boa condição física do cantor, que corre de forma contínua durante alguns minutos.
O Filme das “Canções do Pós-Guerra”
O Portugarte gostou muito de andar pelas ruas de Lisboa a ouvir a poesia de Samuel Úria. Convidamos-te a fazer o mesmo.
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